Monarquias, PIB e desenvolvimento

Nilson Mello*

 

    O casamento do príncipe William com a bela Kate Middleton - antes plebeia hoje duquesa de Cambridge - deu panos para manga. E não me refiro aos comentários sobre os figurinos usados pelo carismático casal ou mexericos em torno dos banquetes que se seguiram à cerimônia na Abadia de Westminster. Esses são aspectos acessórios.

O que as bodas reais de fato nos deram foi o lembrete de que as monarquias têm singular capacidade para servir de esteio a sistemas políticos estáveis, instituições sólidas e nações prósperas.

Não custa lembrar que nada menos do que oito dos 12 países com melhor posição no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) das Nações Unidas são monarquias: Noruega (1ª); Austrália (2ª); Nova Zelândia (3ª); Listenstaine ou Liechtenstein (6º); Holanda (7ª); Canadá (8ª); Suécia (9ª); e Japão (11ª). Todos países com alto grau de desenvolvimento.

Neste caso, evidentemente, estamos nos referindo às monarquias constitucionais, aquelas em que o monarca - ele também - deve obediência à Lei, e não a regimes despóticos, como os que ainda vicejam, sobretudo, no Oriente Médio.

No Reino Unido, exemplo óbvio quando se pensa em monarquia, o poder do soberano começou a ser restringido há 800 anos, com a Magna Carta. E ficou de vez circunscrito com The Bill of Rights da Revolução Gloriosa de 1668/1669. Em comparação, hoje, em pleno século XXI, um presidente à moda brasileira concentra mais poder nas mãos do que qualquer monarca (sendo que alguns sentem-se como o próprio Rei Sol).

 

    Um detalhe importante é que esses oito países listados entre os 12 de melhor desempenho no IDH da ONU não são as nações mais ricas do mundo em termos de Produto Interno Bruto-PIB (conjunto de riquezas produzidas em determinado período por um país), mas ainda assim conseguiram promover altos índices de desenvolvimento e bem-estar social. Note-se que, desses 12 de melhor IDH, curiosamente o de maior PIB (Japão) ocupa a 11ª posição e o segundo de maior PIB, a 10ª colocação (República Federal da Alemanha).

Num exercício de elucubração - sem bases científicas - podemos considerar que um aspecto em comum entre essas oito nações – além, é claro, de serem monarquias constitucionais – está o fato de seus sistemas jurídicos garantirem ampla liberdade individual, valorizando a auto-determinação, e ambiente propício ao empreendedorismo. E isso prova que preocupação social e livre iniciativa - mais do que princípios compatíveis - são condições recíprocas do desenvolvimento.

Essas monarquias são, também, Estados laicos, não obstante a religiosidade de sua população e o próprio fundamento de legitimidade do regime, que remonta a um “direito divino”. Estendendo a elucubração, pode-se dizer que o distanciamento em relação à religião de que gozam hoje significaria maior propensão do Estado a respeitar avanços científicos e a assimilar mudanças sociais - o que de certa forma tem reflexos positivos no IDH.

    Quanto ao tamanho de suas economias, sempre é oportuno ressaltar que PIB robusto não é sinônimo de desenvolvimento, mas apenas um de seus pressupostos. O Brasil é hoje a sétima maior economia do mundo, com um PIB de US$ 2,7 trilhões (2010), mas ocupa uma posição medíocre (73º) no IDH. Aliás, está atrás das principais nações latino-americanas, todas elas com um PIB bem inferior ao nosso. Vejamos: Chile (45º no IDH), Argentina (46º), Uruguai (52º), Panamá (54º); México (56º); Peru (63º); e Costa Rica (62º).

    Por outro lado, o Brasil alinha-se com seus “colegas” do grupo dos BRICs nos dois aspectos: PIB forte e IDH medíocre. A China, hoje segunda economia do mundo, está na 89ª posição no IDH. Rússia e Índia, também economias emergentes e pujantes, na 65ª e 119ª, respectivamente. Em suma, as condições que ensejam forte crescimento econômico não são necessariamente as mesmas que garantem desenvolvimento social.  

De volta às monarquias constitucionais, reconhecer seu valor, não significa propugnar a adoção do regime artificialmente por outros países. Contudo, é de se notar que os que fizeram a independência mantendo-se como Monarquia – casos de Canadá, Austrália e Nova Zelândia, que integram a Commonwealth e têm a rainha da Inglaterra como soberana – tiveram muito sucesso (basta ver novamente a lista do IDH). Outros tentaram imitar e não tiveram o mesmo êxito.

Os Estados Unidos, com uma guerra de independência traumática, fundou-se desde o primeiro momento como República. A trajetória política da maior potência do planeta nem sempre foi serena - como prova a sangrenta Guerra da Secessão – mas a estabilidade institucional e a prosperidade alcançadas a partir daí são indiscutíveis.

Uma das razões para a estabilidade institucional das monarquias seria a divisão de poderes e atribuições entre o chefe de Estado (rei) e o chefe de governo (primeiro ministro), sendo o primeiro perene, mas com forte limitação de poder, e o segundo efêmero, mas executor de fato. No entanto, essa característica também está presente no parlamentarismo republicano. E nem todas as repúblicas parlamentaristas são um exemplo de estabilidade e prosperidade.

O Brasil, que já foi uma monarquia, transfigurou-se em República num golpe atabalhoado e depois viveu mais de um século de grande instabilidade política. Contudo, ninguém garante que a vida teria sido fácil se mantida a Monarquia. Por sinal, o “Império” enfrentou fortes convulsões sociais e revoltas políticas, além de guerras com vizinhos, e a sua própria queda é uma prova de desarranjo institucional.

Então, onde está a resposta?  Algum afoito poderá afirmar que mais do que o modelo o que importa é o povo. Difícil dizer. A única coisa certa mesmo é que o casamento de William e Kate deu, de fato, panos para manga!

 

 

*Diretor da Meta Consultoria e Comunicação



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